Miguel Oliveira fala sobre o rumo do desenvolvimento da Yamaha, a autonomia dos pilotos e a crescente importância dos sistemas eletrônicos na MotoGP
O piloto português de MotoGP, Miguel Oliveira, fez uma análise detalhada e sincera sobre a atual estratégia de desenvolvimento técnico da Yamaha, oferecendo uma visão abrangente sobre a filosofia da equipa e os aspetos que ainda precisam de ser aperfeiçoados — com especial destaque para o papel dos sistemas eletrónicos. As observações de Oliveira surgem após declarações do seu companheiro de equipa, Álex Rins, que sugeriu que a Yamaha poderia beneficiar de um foco mais acentuado na área eletrónica como elemento chave para melhorar o desempenho em pista.
Embora Oliveira não tenha concordado totalmente com todas as críticas de Rins, reconheceu que havia mérito no ponto levantado em relação ao pacote eletrónico. Segundo o ex-vencedor de Grandes Prémios, o rumo atual do desenvolvimento da Yamaha é, em linhas gerais, o mais apropriado, tendo em conta as ferramentas e os recursos disponíveis. No entanto, sublinhou que, no que toca aos sistemas eletrónicos, há sempre espaço para inovação e experimentação criteriosa.
“Acho que fizemos o planeamento necessário”, explicou Oliveira, referindo-se à abordagem da equipa durante a pré-época e o desenvolvimento ao longo da temporada. “No que diz respeito à eletrónica, trabalhamos com o software que temos disponível. A partir daí, tudo depende das pessoas envolvidas — sejam os engenheiros, os analistas de dados ou os próprios pilotos — e da sua capacidade de criatividade. Não estou a dizer que precisamos de ser extremamente inventivos, mas é necessário pensar de forma crítica e perguntar: ‘Qual é o melhor caminho a seguir com o que temos?’”
Esta declaração realça um dos princípios fundamentais do modelo de desenvolvimento da Yamaha: embora as ferramentas de base possam ser limitadas em comparação com as de alguns concorrentes, a responsabilidade é partilhada por toda a equipa, que deve maximizar o que está disponível através de um trabalho inteligente de afinação, interpretação de dados e ciclos de feedback.
Ainda assim, Oliveira foi rápido a admitir que talvez a importância da eletrónica não tenha sido suficientemente priorizada nos testes e na planificação técnica da Yamaha. Concordou com Rins ao destacar que esta área de desenvolvimento — muitas vezes subtil e complexa — pode desbloquear ganhos de desempenho significativos, desde que seja abordada com o rigor e conhecimento necessários.
“Concordo plenamente com o Álex quando se trata de reconhecer o papel vital que a configuração eletrónica desempenha na MotoGP atual”, afirmou Oliveira. “Hoje em dia, não se pode subestimar o impacto que esse fator pode ter. A eletrónica controla muitos aspetos do comportamento da moto — controlo de tração, travão-motor, entrega de potência, ajuste da altura da moto, entre outros. Otimizar esses sistemas pode mudar completamente a sensação que temos em cima da moto e a nossa competitividade ao longo de uma corrida.”
As reflexões de Oliveira evidenciam as crescentes exigências técnicas impostas às equipas modernas de MotoGP. Embora a configuração mecânica — como a geometria do chassis, suspensão e braço oscilante — continue a ser essencial, os sistemas eletrónicos tornaram-se centrais na definição do ritmo de corrida, na gestão de pneus e na consistência ao longo das provas.
Paralelamente ao discurso técnico, Oliveira também abordou outro aspeto particular da sua experiência com a Yamaha: a liberdade que tem na escolha da configuração da sua moto. Numa era em que algumas equipas promovem a uniformidade entre os pilotos para facilitar a análise de dados, a Yamaha parece apostar numa abordagem mais personalizada. Segundo o piloto português, essa autonomia tem-lhe permitido experimentar e optar por componentes que melhor se adequam ao seu estilo de pilotagem, em vez de seguir uma configuração padronizada imposta pela equipa.
“Tenho total liberdade na forma como configuro a minha moto”, sublinhou o português. “Por exemplo, neste momento estou a usar um braço oscilante que provavelmente mais nenhum dos outros três pilotos da Yamaha está a usar. Porquê? Porque gosto da forma como se comporta e dá-me o tipo de feedback e confiança que preciso. Em momento algum houve pressão da equipa para mudar só por uma questão de uniformização. Foi muito claro: se gostas e funciona para ti, então mantém. Simples assim.”
Esta abordagem centrada no piloto pode ser uma das principais qualidades culturais da Yamaha — permitindo aos seus atletas ajustar as suas máquinas com base na sensação pessoal, em vez de aplicar uma metodologia universal. Oliveira acredita que esta filosofia não se aplica apenas a si, mas é transversal a toda a estrutura da Yamaha.
“Exatamente. É mesmo assim”, continuou. “Acho que cada piloto da equipa está a pilotar a sua própria versão da moto, adaptada às suas preferências. E isso é mesmo interessante. Dá-te uma sensação de propriedade e envolvimento no processo de desenvolvimento. Não estás apenas a receber uma máquina e a ser obrigado a fazê-la funcionar — estás ativamente a participar na sua evolução para algo que se adapta a ti.”
Este equilíbrio entre estrutura e flexibilidade parece ser uma peça central da atual estratégia da Yamaha: dar liberdade aos pilotos para intervirem nas afinações enquanto a equipa procura evoluir áreas técnicas chave, como a eletrónica, através de um desenvolvimento direcionado. No entanto, as observações de Oliveira também revelam que as atuais limitações ao nível do software e da engenharia eletrónica podem representar um ponto fraco que precisa de ser resolvido com maior urgência.
À medida que o panorama da MotoGP continua a evoluir — com fabricantes como a Ducati e a KTM a avançarem rapidamente no desenvolvimento de sistemas eletrónicos e aerodinâmica integrada — a capacidade da Yamaha para reduzir a diferença de desempenho dependerá, em grande parte, da eficácia com que conseguir modernizar a sua abordagem tecnológica sem comprometer a autonomia dos seus pilotos, que se tornou um dos pilares da sua identidade.
Em suma, os comentários de Miguel Oliveira oferecem uma visão abrangente sobre o estado atual do projeto MotoGP da Yamaha. Apesar de a equipa manter um ambiente interno positivo que valoriza o contributo e a liberdade dos pilotos, existe um entendimento comum entre os seus membros de que a evolução técnica — especialmente na área eletrónica — precisa de acelerar caso a Yamaha queira regressar aos lugares cimeiros. Com pilotos como Oliveira e Rins a falarem de forma aberta e construtiva, a Yamaha poderá ter a clareza necessária para avançar para a próxima fase do seu desenvolvimento competitivo.